terça-feira, 5 de abril de 2011
Valor de Culto X Valor de Exposição
O valor de culto é inicialmente o objetivo que determina as origens históricas da arte: o culto diz respeito a práticas mágicas, rituais e culturais que foram sendo esquecidas.
Durante a pré-história as imagens, por exemplo, faziam parte de um ritual mágico para assegurar uma caça bem sucedida. Estas imagens mágicas não eram criadas com o objetivo de serem apropriadas e expostas para apreciação de todos:

"O alce, copiado pelo homem paleolítico nas paredes de sua caverna, é um instrumento de magia, só ocasionalmente exposto aos olhos dos outros homens: no máximo, ele deve ser visto pelos espíritos."Apenas mais tarde a obra passa a ser concebida como obra de arte, mas ainda assim, a igreja até hoje guarda ou preserva grandes obras que nunca vimos e talvez jamais iremos ver.
"O valor de culto, como tal, quase obriga a manter secretas as obras de artes: certas estátuas divinas somente são acessíveis ao sumo sacerdote, na cella, certas madonas permanecem cobertas quase o ano inteiro, certas esculturas em catedrais da Idade Média são invisíveis, do solo, para o observador."
Isto faz sentido na medida em que submeter estas obras à exposição indiscriminada desvalorizaria seu caráter sagrado. Enfim, as imagens eram registradas com objetivos bastante práticos: para executar ou ensinar práticas mágicas, ou para que fossem contempladas. Dar visibilidade ao Sagrado através das imagens, tornar o Divino, de alguma maneira, apreensível aos olhos, foi uma prática adotada pelo Cristianismo, mais fortemente a partir do quinto século.
"À medida que as obras de arte se emancipam do seu uso ritual aumentam as ocasiões para que elas sejam expostas".Se antes as técnicas estavam a serviço do ritual, atualmente, se emanciparam, tornaram-se técnicas de reprodução em massa, e a exponibilidade das obras de arte cresce em tamanha escala que a supremacia de seu valor de exposição gera uma mudança qualitativa profunda: uma verdadeira refuncionalização da arte.
Esta refuncionalização da arte gerada pela supremacia do valor de exposição, por outro lado, tem levado à apropriação e banalização das imagens pela Indústria Cultural (estudada por Adorno) voltada para o consumo de massa. Tudo isto se aplica, em primeiro lugar ao cinema, que será abordado mais adiante.
A aura da obra de arte substituída por sua existência única e distante - pela existência serial

“Observar, em repouso, numa tarde de verão, uma cadeia de montanhas no horizonte, ou um galho, que projeta sua sombra sobre nós"
"uma figura singular, composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja”
"Mesmo na reprodução mais perfeita, um elemento está ausente: o aqui e agora da obra de arte, sua existência única, no lugar em que ela se encontra. É nessa existência única, e somente nela, que se desdobra a história da obra. Essa história compreende não apenas as transformações que ela sofreu, com a passagem do tempo, em sua estrutura física, como as relações de propriedade em que ela ingressou. Os vestígios das primeiras só podem ser investigados por análises químicas ou físicas, irrealizáveis na reprodução; os vestígios da segunda são o objeto de uma tradição, cuja reconstituição precisa partir do lugar em que se achava o original.A reprodução técnica, por mais que deixe intacto o conteúdo, desvaloriza a aura da obra de arte original, por duas razões:
O aqui e agora do original constitui o conteúdo da sua autenticidade, e nela se enraíza uma tradição que identifica esse objeto, até nossos dias, como sendo aquele objeto, sempre igual e idêntico a si mesmo. A esfera da autenticidade como um todo, escapa à reprodutibilidade técnica, e naturalmente não apenas à técnica. Mas enquanto o autêntico preserva toda sua autoridade com relação à reprodução manual, em geral considerada uma falsificação, o mesmo não ocorre no que diz respeito à reprodução técnica”.
“(...) a reprodução técnica tem mais autonomia que a reprodução manual. Ela pode, por exemplo, pela fotografia, acentuar certos aspectos do original, acessíveis à objetiva – ajustável e capaz de selecionar arbitrariamente o seu ângulo de observação --, mas não acessíveis ao olhar humano. Ela pode, também, graças a procedimentos como ampliação ou câmera lenta, fixar imagens que fogem inteiramente à ótica natural.
"(...) a reprodução técnica pode colocar a cópia do original em situações impossíveis para o próprio original. Ela pode, principalmente, aproximar do indivíduo a obra, seja sob a forma de fotografia, seja de disco”
Na aura estão incluídas as várias associações que a obra adquiriu com o tempo, testemunhos de uma existência histórica. Por isso, a perda da aura é consequência de fatores intimamente ligadas aos movimentos de massas. O primeiro fator diz respeito à superação do caráter único dos objetos, através de sua reprodução. O segundo fator diz respeito à superação da distância necessária para fruir a aura do objeto, diz respeito a essa necessidade, cada vez maior, das massas modernas, de possuir o objeto o mais próximo possível, de fazer as coisas “ficarem mais próximas”, através da sua reprodutibilidade.
O homem contemporâneo, para Benjamim, está simplesmente “ligado” ao que o rodeia, não sendo assim possível que alcance a “correta distância” necessária para alcançar a aura. Com a realidade cada vez mais próxima, as imagens desta se tornam cada vez mais acessíveis, e por isso, mais banais. A aura, para ele, parece ser incompatível com os sonhos de consumo imediato do capitalismo.
Essa crescente necessidade das massas de “apropriar-se do objeto na imagem e na reprodução”, dá a ilusão de verdadeiramente viver os acontecimentos, o que seria positivo já que aumenta nosso conhecimento. Em contrapartida, essa proximidade ilusória, leva a nos contentarmos e acomodarmos com esta experiência enganadora, não buscando assim a experiência vivida e, somente, a mediatizada. Essa necessidade é largamente satisfeita pela televisão, por exemplo: ao assistir as telenovelas, as pessoas se projetam nas personagens e se satisfazem a partir das satisfações ali expostas, sem, ao menos, experimentá-las de fato.
A cumplicidade entre arte e consumo, a extirpação dos objetos em relação à tradição, a massificação, a sincronia substituindo a diacronia e o valor de exposição a efetuar-se na vez do valor de culto são alguns dos fenômenos que se articulam com o tema da decadência da aura.
Têm-se, portanto, decorrente da perda da aura, duas conseqüências aparentemente contraditórias: ao mesmo tempo em que se empobrece a experiência baseada na tradição, ocorre um aspecto positivo que é o favorecimento da democratização e da politização da cultura. Essa visão otimista de Benjamim, contudo, não dura muito – devido à época, que não incitava ao entusiasmo.
“O conceito de aura permite resumir essas características: o que se atrofia na era da reprodutibilidade técnica da obra de arte é a sua aura. Esse processo é sintomático, e sua significação vai muito além da esfera da arte. Generalizando, podemos dizer que a técnica de reprodução destaca do domínio da tradição o objeto reproduzido. Na medida em que ela multiplica a reprodução, substitui a existência única da obra de arte por uma existência serial. E na medida em que essa técnica permite à reprodução vir ao encontro do espectador, em todas as situações, ela atualiza o objeto reproduzido. Esses dois processos resultam em um violento abalo da tradição, que constitui o reverso da crise atual e a renovação da humanidade. Eles se relacionam intimamente com os movimentos de massa, em nossos dias. Seu agente mais poderoso é o cinema. Sua função social não é concebível, mesmo em seus traços mais positivos, e precisamente neles, sem seu lado destrutivo e catártico: a liquidação do valor tradicional do patrimônio da cultura.”
A crise da modernidade, a morte do narrador, o nascimento do flâneur
Naquela época o mundo estava sofrendo enormes modificações, gerando muitas novidades, novas tecnologias. Estas transformações deixavam o homem pasmo perante elas, fazendo ele preferir sair atrás delas nas ruas do que ficar em casa , perpetuando as tradições.
Não havia mais lugar para o cultivo da sabedoria, pois tudo se tornava transitório. Sabedoria , para ele, seria a experiência que se obtém com a tradição. O homem sem a sabedoria se tornou alienado e estático diante de novas tecnologias.
A multidão passou a ficar mais apressada , dando mais valor a atividade visual do que a auditiva.
A perda da tradição tem como um grande exemplo as novas regras de espaço. Bairros inteiros , cheios de tradição, foram destruídos para dar lugar à funcionalidade do espaço moderno.
Hoje em dia o indivíduo não quer mais sair de sua casa atrás das novidades, das novas tecnologias. A rua passou a ser um local incômodo para o homem devido ao trânsito, a violência e etc. A casa passou a ser um refúgio para o homem. Ele passou a ficar dentro de casa e a colocar essas mesmas novidades tecnológicas dentro. Um exemplo claro disso é o computador. Nele se pode pagar contas, falar com um amigo sem sair de casa. A casa virou hoje um refúgio, uma verdadeira fuga do moderno através do moderno.
Por : Bonnie Gomes
Benjamin, um pensador da modernidade

"Quando Marx empreendeu a análise do modo de produção capitalista, esse modo de produção ainda estava em seus primórdios. Marx orientou suas investigações de forma a dar-lhes valor de prognósticos. Remontou às relações fundamentais da produção capitalista e, ao descrevê-las, previu o futuro do capitalismo. Concluiu que se podia esperar desse sistema não somente uma exploração crescente do proletariado, mas também, em última análise, a criação de condições para sua própria supressão”.
O ensaio de Benjamin é estruturado em teses sobre a experiência estética e sua penetração pela técnica. O contexto político no qual surge (o Fascismo) ajuda no entendimento do tom ideológico e da motivação política que movem o autor na apresentação destas teses.
…
Neste texto as teses - as ideias fundamentais de Walter Benjamin - dividem-se em dois grupos:
1. sobre o papel da técnica e a condição da arte, debruçando-se sobre o destino do valor artístico;
2. sobre a experiência sensível e a estética.
Ambas são desenvolvidas ao longo do texto, em vários pontos e subtemáticas, tais como a reprodutibilidade, a perda da aura, o fim do valor de culto, a dissolução da arte (estética) - fim da arte, e a vanguarda.
O prólogo assina-la a temática essencial de todo o texto: as tendências de evolução da arte, em função das condições de produção da época. Fala-nos também na eliminação de conceitos tradicionais como os de criatividade, genialidade, e valor eterno e secreto, conceitos esses que para Benjamin foram aplicados de forma descontrolada, e aproveitados para fins fascistas.
Por outro lado, e na sequência desta “perda”, apresenta-nos a introdução de novos conceitos, inadequados para aqueles fins fascistas, vindo ao encontro de exigências revolucionárias em política de arte.
A interpretação de Benjamin sobre o pensamento de Marx é a de que um dos prognósticos que este fez foi o de que o capitalismo cria suas condições de supressão, inclusive a tecnologia.
Os frankfurtianos trataram de um leque de assuntos que compreendia desde os processos civilizadores modernos e o destino do ser humano na era da técnica até a política, a arte, a música, a literatura e a vida cotidiana. Dentro desses temas e de forma original é que vieram a descobrir a crescente importância dos fenômenos de mídia e da cultura de mercado na formação do modo de vida contemporâneo.
De uma maneira geral, a Escola de Frankfurt sublinha os lados negativos da modernidade industrial. Walter Benjamin, entretanto, não é dogmático em relação à Escola de Frankfurt. Em vez de uma natural antipatia pela massificação e pela influência dos grupos econômicos, o alemão foi mais longe e atribuiu ao advento das novas tecnologias a forma mais eficaz para a discussão de matérias tão caras ao marxismo como, por exemplo, as minorias. Estas passaram a ter espaços próprios de difusão da mensagem, não sendo oprimida a sua fala.
As experiências soviéticas feitas com o cinema, rádio e artes gráficas em seguida à revolução, levaram-nos a entender que as tecnologias de comunicação em surgimento estavam promovendo uma transformação no modo de produção e consumo da arte. Os privilégios culturais que durante tanto tempo a burguesia havia usufruído estavam em vias de ser derrubados, bastando apenas que as massas tomassem o controle dos meios de produção.
O capitalismo criara sem querer as condições para uma democratização da cultura, ao tornar os bens culturais objeto de produção industrial.
Adorno tem uma postura mais pessimista do que a de Benjamin: de acordo com ele, a pretendida democratização da cultura promovida pelos meios de comunicação é motivo de embuste, porque esse processo faz parte da massificação com finalidades capitalistas.
O pensamento de Walter Benjamin e o legado kantiano: uma nova forma de conceber o conhecimento
A filosofia de Walter Benjamin se constrói como uma filosofia que articula experiência e
linguagem. As concepções lançadas em seus textos de juventude se modificam e se trans-
formam, cumprindo a tarefa a que ele se propõe, em 1917, no texto Sobre o programa da
filosofia futura: apresentar um conceito superior de experiência capaz de incluir a religião e
a história. Nesse texto, Benjamin elabora uma crítica ao conceito kantiano de experiência e
aponta como é possível pensar um novo modo de conhecer, ancorado na ideia de filosofia
como apresentação, Darstellung. Não se trata de expor um método, mas de mostrar que o
conhecimento não se refere ao domínio do saber more geométrico e, sim, a um Ser que se
auto-apresenta: a verdade. Nessa perspectiva, pretendo explicar como a reflexão de Walter
Benjamin sobre a dimensão expressiva da linguagem expõe a relação epistemológica entre
arte, filosofia, teologia e história.
(Fonte:http://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:AbuIEk1AF7QJ:www.oquenosfazpensar.com/adm/uploads/artigo/o_pensamento_de_walter_benjamin_e_o_legado_kantiano:_uma_nova_forma_de_conceber_o_conhecimento/25_12_Ana_Benjamin.pdf+programa+para+uma+filosofia+futura+walter&hl=pt-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjxcs77E6c2iw2x9VjIM_E_9ZrbsXaayGWOWjMk302FTtagKG3oikn9YV0ObKo0K-S6Z27KUgRf8tfAOhuGkuP4hYdGAjJwlgt36c9nx_178anvxCCaIpGHOOGtoF8yvv1_klgA&sig=AHIEtbROYyiEZ3V5kdN5lvWmLzEYu4ky4g)
Walter Benjamin e a história messiânica: contra a visão histórica do Progresso
A alegoria no drama barroco alemão e a conceição barroca da história
A fim de caracterizar a alegoria, poderíamos sublinhar como uma característica própria o fato de que nela “cada pessoa, cada coisa, cada relação pode significar qualquer outra” (Ibidem, p. 197). Em oposição ao símbolo, a alegoria não possui a sua clareza e harmonia, a sua pretensão de transparência e imediatez .
A alegoria “(...) mergulha no abismo que separa o ser visual e a significação, nada tem da auto-suficiência desinteressada que caracteriza a intenção significativa, e com a qual ela tem afinidades aparentes” (Ibidem, p. 187-188). Pelo contrário, remete à obscuridade, a uma certa ineficiência que a obriga a recorrer sempre a um sentido exterior, alheio. É a marca da cisão de um mundo estigmatizado pela Queda.
A alegoria barroca remete à concepção barroca da história, ou seja, a essa tensão entre a história-destino e a anti-história no marco de uma visão imanente da história.
Com respeito à história-destino, essa história selvagem é a figura da morte que vai servir como ordenadora. Na alegoria barroca a morte está permanentemente presente como aquele fundo do sentido. Todos os sentidos acabam por abismar-se no sem-sentido da morte, nesse fundo de que nada escapa às ações de qualquer homem e que conduz à ruína do mundo.
As cenas de martírio, a abundância de fatos onde se exalta a dor física, as imagens de decomposição e destruição acabam cobrando seu sentido no cadáver. “se os personagens do drama barroco morrem, é porque somente assim, como cadáveres, tem acesso à pátria alegórica. Se eles são destruídos não é para que acedam à imortalidade, mas para que acedam à condição de cadáver.” (Ibidem, p. 241)
A morte, então, não é o fim da vida senão que esta alojada no interior da vida, mora nela como um parasita que a constitui e que é seu princípio organizador. É esse sem-sentido, essa fatalidade, esse destino o fundo sobre o qual a vida se recorta e adquire o seu sentido. A vida está a serviço da morte.
No processo alegórico a vida do objeto lhe é subtraída para cobrar um novo sentido alegórico a partir da sua morte. Mas ao mesmo tempo, ao estabilizar as coisas dentro de uma significação, estas ficam fora da demolição à qual o desenvolvimento da história as arrasta. Nessa significação as coisas ficam imutáveis, indiferentes ao passo do tempo e são redimidas da vulnerabilidade da morte.
A alegoria como linguagem característica do drama barroco alemão produz a mediação entre a origem e a estrutura. De um lado, assinala a morte e, do outro, aponta para um intento de conservação da vida a partir da estabilização.
A origem emerge da historia quebrando a lógica do natural desenvolvimento dos acontecimentos nela inscritos e, ao mesmo tempo, está inserida nessa história. É ruptura, morte da ordem de sentido estabelecida que é surpresa pela novidade de um novo sentido que emerge.
O drama barroco alemão e a história
Durante a contra-reforma, o barroco é movimento cultural que atua como um veículo de propaganda eficiente para consolidar a religião católica.
O drama barroco, para conseguir este intento, renuncia à transcendência da história e se transforma num drama secularizado, ligado a uma conceição da história como natureza. Alheia a qualquer transcendência, a história escapa da sua inscrição na história da salvação. É imanente e não conduz a uma finalidade, não tem sentido último. No drama barroco alemão é o destino que conduz os personagens à morte e nada tem a ver as ações que eles pudessem realizar. Não há nele conotação ética de nenhum tipo. São as forças da natureza as que atuam além dos homens. O barroco se centra no anuncio dessa catástrofe.
Mas esta história-destino, tem a sua contra-cara no intento de estabilização da história, numa anti-história. É esta a função que corresponde ao Príncipe a partir da legitimação do seu poder absoluto. Ele tem que criar as condições para afastar as ameaças da rebelião e da guerra civil e garantir à sua comunidade a prosperidade através do exercício da sua autoridade junto à autoridade da Igreja.” (Benjamin, 1984, p. 97)
Estas duas caras remetem à concepção imanente da história, à história como natureza que opõe a historia natural selvagem à história natural instaurada pela vontade do Príncipe.
Baseados no conhecimento de Kant
José Renato Salatiel*
Kant dividiu o conhecimento em 12 conceitos básicos que são representações chamadas de categorias |
Espaço e tempo
sábado, 2 de abril de 2011
Ensaio sobre Leskov
Leskov é um narrador (um “storyteller”), não um romancista. Romancista é Proust, o homem isolado da sociedade que procura destilar o “sentido de uma vida”. Leskov está próximo do trabalho artesanal – chega a afirmar em carta que “a literatura é um trabalho manual”.
O argumento de Benjamin é muito simples e poderoso: a capacidade de contar histórias está diminuindo cada vez mais, e com ela a possibilidade de trocar nossas experiências. O narrador é essa figura de um passado que vai ficando cada vez mais para trás. Em contraposição à narração, com suas “múltiplas camadas transparentes”, Benjamin coloca a informação. “Cada manhã recebemos notícias de todo o mundo. E, no entanto, somos pobres em histórias surpreendentes. A razão é que os fatos já nos chegam acompanhados de explicações.”
Seja no arquétipo do agricultor que residiu sempre no mesmo lugar e é dotado da sabedoria do passado, seja no marinheiro que viajou por todo o mundo e goza da sabedoria do distante, o narrador é dotado da capacidade de dar conselhos, prática que envolve a sugestão de como continuar uma história mais do que dizer o que fazer. A narração é o espaço da memória, “a mais épica das faculdades”. O contrário do narrador é o homem capaz de comentar qualquer coisa, desde que não dure mais do que um instante.
Na narrativa se imprime a experiência do narrador, “como as mãos do oleiro na argila do vaso”. Com a “queda das ações da experiência” vai-se a capacidade de contar histórias, o que por sua vez tranca cada vida vivida em si mesma, esgarçando a comunidade.
(Fonte:http://ldopaeditora.wordpress.com/2009/10/17/narrador-leskov-benjamin/)
Concepção de experiência

A presente dissertação tem por objetivo apresentar a degradação da experiência humana na modernidade a partir do diagnóstico feito por Walter Benjamin. Para tanto, num primeiro momento, parte-se de um rápido percurso da história da filosofia a fim de delinear o conceito de experiência e analisar um dos primeiros textos em que Benjamin trata diretamente do assunto, “Sobre um programa da filosofia vindoura”. Num segundo momento, busca-se demonstrar como vai acontecendo a decadência da experiência a partir do ensaio “Experiência e pobreza”, em que Benjamin considera que aos pobres de experiência resta apenas assumir uma nova barbárie. O tema também aparece em “O narrador”, em que o autor demonstra o aniquilamento de uma experiência, outrora sinônimo de sabedoria e autoridade, consolidada por meio de sua transmissão de geração em geração, própria de uma organização coletiva, comunitária, ritualística e artesanal. As formas narrativas correspondentes são sintomáticas deste processo de esfacelamento da experiência: a narração - que vigorava no solo de um tempo onde ainda tinha-se tempo para contar e ouvir histórias - fora substituída pelo romance, caracterizador dos indivíduos isolados e solitários, e este, por sua vez, substituído pela informação jornalística, forma narrativa fragmentada e desconexa. Analisar a questão da experiência (erfahrung) em Walter Benjamin é contrapô-la à noção de vivência (erlebnis). Na esfera da vivência, saturada de eventos e sensações, resta ao ser humano a capacidade de reagir a esses estímulos (reportando à noção de choque em Freud). A memória (e seu correlato – o esquecimento) é imprescindível à experiência, mas perante os choques, o ser humano só armazena suas vivências na camada mais superficial da consciência, impossibilitando recursos para a experiência estética ou poética. Num terceiro momento, procura-se, nesse estudo, fazer um diálogo entre as constatações e os conceitos da filosofia da experiência benjaminianas com algumas imagens literárias, buscando, na literatura, elementos que vicejam a reflexão filosófica.
Da vida dos estudantes
O estudantado alemão está, em grau maior ou menor, obcecado pela idéia de que precisa aproveitar a juventude. Aquele tempo de espera, totalmente irracional, por um cargo e casamento tinha que engendrar um conteúdo qualquer, contanto que fosse leve, pseudo-romântico e um bom passatempo. Um terrível estigma pesa sobre a celebrada jovialidade das canções estudantis, sobre a nova imponência da rapaziada. É o medo do futuro e, ao mesmo tempo, um compactuar com o inevitável filisteísmo, evocado de bom grado na figura do “velho”. Já que se vendeu a alma à burguesia, inclusive profissão e casamento, todo o mundo se agarra freneticamente àqueles poucos anos de liberdade burguesas. A troca se faz em nome da juventude.